sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Revista Mundo Jovem

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Entrevistas
publicadas na edição nº 392, novembro de 2008.

Em que as tecnologias modificam as nossas vidas?
O impacto das novas tecnologias na sociedade é uma realidade da qual não podemos fugir. Entre luzes e sombras, caminhamos para o futuro com as tecnologias entrando cada vez mais nas diferentes tarefas do cotidiano. Embora o Brasil tenha ingressado mais tarde nestes avanços, segundo o sociólogo Laymert Garcia dos Santos, o país pode ter um ponto de vista diferente.
Com uma população mais jovem e moderna do que os países do Primeiro Mundo, tem uma abertura para o novo, cujo potencial é muito grande. Para isso, é necessária a articulação da nossa cultura, muito rica e vital, com as novas tecnologias.

Laymert Garcia dos Santos,
sociólogo da tecnologia e professor da Unicamp-Campinas.

Mundo Jovem: Qual o contexto atual das mudanças tecnológicas?

Laymert Garcia dos Santos: Existem três tipos de tecnologias interligadas. São três grandes linhagens tecnológicas que começaram a modificar o mundo a partir da década de 1970: as chamadas tecnologias da informação, que lidam com a informação digital; a tecnologia genética, que lida com a informação genética; e uma terceira, que é a nanotecnologia, que lida com as transformações da matéria em escala nano.

De um lado, temos as modificações da tecnologia nas informações comunicacionais, incluindo aí o computador e tudo o que está relacionado à comunicação digital. De outro lado, estão as tecnologias da vida, e as da transformação da matéria em escala nano.

Uma questão importante é que há uma convergência dessas tecnologias. E ela é cada vez maior. Há um efeito de aceleração pelo fato de elas estarem confluindo e pelo fato de umas estarem influindo no desenvolvimento das outras. É claro que a informação genética não poderia existir sem a informação digital. Todas elas inserem-se dentro da revolução cibernética que veio com a Terceira Revolução Industrial. E a da escala nano também não poderia existir se não tivesse uma interlocução forte entre estas três linhagens.


Mundo Jovem: E isso atinge a vida das pessoas?

Laymert Garcia dos Santos: Isso modifica completamente a vida das pessoas, sobretudo a das novas gerações. As pessoas que têm atualmente 60 anos, eram jovens quando a revolução cibernética começou a acontecer, na década de 1970. Algumas dessas pessoas encontram dificuldade numa série de coisas. Do computador, por exemplo, assim como em relação ao celular, à máquina fotográfica, que também é digital, a secretária eletrônica, enfim, todos os aparelhos que antes não eram digitais e que hoje são. Por exemplo, mandar uma mensagem escrita através do celular qualquer jovem faz com a maior facilidade. Isto ocorre porque ele já nasceu nessa geração completamente cibernética.

Só que esse processo evolui numa rapidez espantosa: nós estamos vivendo uma aceleração da aceleração. Aquilo que os jovens conseguem fazer com muita velocidade e facilidade, pelo menos aqueles que estão inseridos neste mundo digital, eles também vão ter que saber lidar com a evolução crescente. Caso contrário, ficarão numa situação semelhante à da geração anterior.


Mundo Jovem: Num país tão diverso quanto o Brasil, de desigualdades sociais tão grandes, como é que as novas tecnologias entram?

Laymert Garcia dos Santos: É um problema seríssimo realmente, porque o upgrade tecnológico das novas gerações, além de ser um problema geracional, é também um problema social para aqueles que não estão dentro do trem-bala. Quem está dentro dele é quem está acompanhando ou está podendo acompanhar a evolução tecnológica. A nossa sociedade, como é muito desigual, tem muitas pessoas que não podem acompanhar. E como existe uma aceleração crescente, os que estão fora do trem ficarãocada vez mais fora mesmo. Um dos problemas da Terceira Revolução Industrial é que ela é, pela primeira vez, excludente, não inclusiva. E o capitalismo torna-se cada vez mais excludente: não tem lugar para todos.


Mundo Jovem: Então as tecnologias podem ter benefícios e riscos?

Laymert Garcia dos Santos: A questão principal com relação às tecnologias é que a gente não considera o que alguns autores chamam de efeitos colaterais ou o acidente. Todas as tecnologias, quando inventadas, inventam também o seu acidente específico. Nós sempre estamos focados na positividade da tecnologia, nunca na negatividade.

Dos anos de 1980 para cá, começou a surgir dentro da Sociologia um ramo chamado Sociologia do Risco, que começou a pensar justamente nos efeitos colaterais inerentes à tecnologia, os efeitos sociais. O risco começou a ser pensado e considerado, mas acho que ainda falta muito a ser pensado sobre todos os efeitos disso.


Mundo Jovem: Existe a possibilidade de um equilíbrio em relação a este ufanismo que há com as tecnologias?

Laymert Garcia dos Santos: Existe uma espécie de ufanismo em relação principalmente à tecnociência, e não só às tecnologias. Porque a gente ainda acredita muitas vezes numa idéia de progresso infinito, que vem do século 18, e numa idéia de progresso inquestionável. Penso que a sociedade tem que colocar sobre a mesa os riscos e os efeitos colaterais junto com a tecnologia e discutir isto tudo junto. Porém a tecnociência não pensa assim, porque cada vez que estas questões são colocadas na mesa, os cientistas acham que o questionamento é uma saudade do tempo pré-moderno, que é arcaico. A mídia, por exemplo, só é aberta a um único ponto de vista, que é do progresso da ciência. Não sou contra o progresso, mas isso tudo precisa ser discutido também do ponto de vista político e não apenas científico.


Mundo Jovem: Você acha que existem algumas ações políticas, governamentais ou não, de acesso às novas tecnologias?

Laymert Garcia dos Santos: Conheço uma experiência interessantíssima, que é do Ministério da Cultura, que tenta pensar as novas tecnologias junto com a questão da cultura brasileira, sobretudo voltada para o público jovem. Os pontos de cultura, por exemplo, são pensados nesta perspectiva, já integrando tecnologia e cultura, que quase nunca na nossa sociedade foram pensadas junto. O uso de softwares livres e a produção do conhecimento e da informação podem favorecer setores excluídos.


Mundo Jovem: Como a escola poderia usar melhor a tecnologia?

Laymert Garcia dos Santos: Acho que a escola ainda não entendeu completamente o sentido da Terceira Revolução Industrial. Ela acha que a tecnologia é só uma ferramenta. Mas não no sentido como a tecnociência usa, porém uma ferramenta como apenas um instrumento. A tecnologia é muito mais do que isto. A cibernética nos introduz numa outra dimensão, porque nossa vida passa a ter uma outra dimensão.

Além de massa e energia, a terceira dimensão da matéria é a informação. A revolução cibernética lida com o plano da informação e isto é muito mais do que uma questão só de aparelhos e de como aprender a lidar com eles. Existe uma lógica diferente, uma flexibilidade operatória diferente, uma maneira de viver e de pensar diferente e a escola ainda não entendeu este sentido amplo. Ela precisa avançar.


Tecnologias no cotidiano: desafios para a educação

Observando ao redor, no ambiente doméstico há o computador, a TV, o microondas, a antena parabólica, o telefone, o vídeo, o fogão... em tudo pode-se observar a presença da tecnologia e/ou o produto de um processo tecnológico: a caneta, o cafezinho, a água ozonizada, a tesoura, o tecido da toalha etc. Ocorre que esses objetos e alimentos são resultado de processos tecnológicos, da ciência, da invenção, da criatividade do ser humano para facilitar, aprimorar a vida, gerando mais qualidade da espécie.

O velejador Amyr Klink afirmou que a verdadeira tecnologia está em garantir a qualidade do que se faz aproveitando o máximo possível de tudo o que se dispõe, para se atingir uma meta ou objetivo. Por exemplo: ele calculou quantos dias velejaria até o Pólo Antártico e organizou porções diárias de ameixas devidamente embaladas, pesando as gramas da fruta para não exceder o limite estritamente necessário durante o período em que precisaria se alimentar. Fez isso também para facilitar seu uso e reduzir as possibilidades de sucumbir todo seu projeto. Ou seja, evitar qualquer obstáculo, de forma planejada. Ele sugere que a tecnologia está para atender à humanidade desde a sua forma mais simples até a mais sofisticada.

Criação e desenvolvimento

Desde que o ser humano passou a se sentir ameaçado na sua sobrevivência, iniciou-se um processo de conquista, de domínio sobre os recursos naturais através do seu alto grau de inteligência e criatividade para utilizar os recursos naturais existentes em seu próprio benefício. Criou diferenciadas ferramentas em cada época para dominar debilidades físicas em relação às demais espécies. Por conseguinte, através da invenção de inúmeros equipamentos, ampliaram-se suas competências associadas ao raciocínio e à habilidade manual própria do ser humano.

Outro fator que contribuiu para o aprimoramento, e ainda contribuiu para a tecnologia, é a capacidade natural de relacionamento dos humanos, da qual originou a cultura. Essa diversidade cultural resultou numa agregação de saberes, de formas e de técnicas de fazer coisas, costumes e hábitos sociais que foram propagados de geração em geração.

Estratégias para a educação

Mesmo com toda a tecnologia presente no mundo, é preciso aprimorar as estratégias mais eficazes para que nós, professores/educadores, e os alunos sejamos ou passemos a ser bons comunicadores. Esse domínio da comunicação requer prática, paciência, persistência e o desenvolvimento da capacidade de aprender a aprender, de adquirir o know-how a partir da leitura de bons livros, jornais, revistas, filmes, músicas, participando de cursos, estando atentos ao que acontece no mundo que nos cerca. É preciso dedicação também para aperfeiçoar a competência de aprender a fazer mais com menos, como evidenciou Amyr Klink ao planejar sua viagem.

Achei interessante a análise entre as linguagens exploradas num filme e as linguagens de um livro. Neste último a imaginação pode ser incitada a visualizar ambientes, experimentar, afetando o leitor, enredando-o e/ou cativando-o, fazendo com que instigue a imaginação, cabendo-lhe a tarefa de recriar a mensagem conforme sua cultura, suas vivências e o contexto criado pelo autor. Como o código é escrito, o ritmo pode ser mais lento, permitindo retrocessos.

Há autores que, por estilo, preocupam-se em sensibilizar o público através das linguagens visuais (descrição de luzes e cores de um cenário), auditivas (musicalidade e ritmo em rimas), olfativa (descrição de odores), gustativas (de sabores), além da sinestesia, que privilegia a narração de movimentos tais como coreografias. Assim, com inúmeras estratégias, pode-se munir de todas essas vantagens e junto com o estudante iniciar o exercício da leitura crítica do que vem explícito e do que é veiculado nas entrelinhas nos meios de comunicação.

Marinez de Paula Vendramel Fernandes
professor e militante de direitos humanos,
professora em Ariquemes, RO.
Endereço eletrônico: marinez.paula@gmail.com




Tecnologias na Educação
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